O AMIGO sempre foi louco por
cinema. Arrumou passagem. Conseguiu chegar a Hollywood, de onde jurava voltar
mais famoso que marido de Elizabeth Taylor. Mas já se acha, o mesmo José da
Silva, de regresso ao Rio:
– Fui motorista de praça em
Los Angeles. Não aprendi cinema; em compensação, agora, sou bom no volante.
Para mostrar como estava
atualizado, sem jamais perder o Brasil de vista, contou que sempre encontrava
compatriotas e lia, todos os dias, jornais do país.
– Fiquei tanto tempo fora, mas
estou, inteiramente, em dia.
Quando aludimos a Napoleão de
Alencastro chamou de senador. Quando citamos a Cinelândia, falou ainda em
Gaiola de Ouro. Confessou que sentia saudade de nosso carnaval e disse que,
para o ano, vai brincar os quatro dias no “High Life”, para descontar as folias
que perdeu. E afirmou que pensava em comprar boxe no Mercado da Praça Quinze,
para negociar com frutas, porque foi assim que seu pai enriqueceu...
Sugeri que talvez uma barraca
de arroz na feira fosse mais vantajosa. E ele:
– Sossega, leão.
Repetiu outros ditados de seu
tempo, para mostrar como não se esquecera de coisa alguma, e, sobretudo, que se
achava inteiramente em dia:
– Comigo, não, violão! ‘tás
pensando que sou a Valdemar, para ficar na linha? Quero ir pra frente. Preciso
de trabalho grau dez. Com a prática que paguei, vou mostrar o que é que a
baiana tem.
Desconhecendo que não existe
mais níquel:
– Quero me encher de níqueis.
Disse para quê:
– Para voltar a Hollywood e
estudar cinema. Quando passar pela Galeria Cruzeiro, todo mundo vai olhar para
mim. E – engraçado – sempre desejei que um filme em que eu trabalhasse fosse
exibido no Eldorado, lá junto do Café Nice, porque era naquela esquina que eu
fazia ponto. E vou conseguir isso.
E o amigo atualizado,
lembrando tudo o que é diplomata que fica anos seguidos fora do Brasil, e,
quando volta, quer sempre mostrar que não perdeu nossos costumes de vista,
contou a última anedota: aquela do papagaio que ia namorar no galinheiro, pisou
num fio elétrico, tomou choque e comentou: “– Ué! Namoro antigo e, hoje, estou
nervoso!...”
(In Telhado de
Vidro. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 28 de novembro de 1962)
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Galeria Cruzeiro (Av. Rio Branco, Rio de Janeiro, anos 40) |