Lembro-me do curso primário, no
Grupo Amauri de Medeiros, no Recife. Cantávamos o Hino Nacional, o da Bandeira,
o da Independência e o de Pernambuco, antes, durante e depois das
aulas. E a professora repetia sempre:
– O Brasil é um país muito rico.
Com freqüência, mostrava os
símbolos do Pavilhão Nacional que José Bonifácio desenhara:
– O amarelo representa o ouro do
Brasil.
Nas lições de História, ouvíamos
fatos espantosos sobre a cobiça dos piratas franceses e dos hereges flamengos,
que fizeram incursões violentas em nosso chão, todos de olho na fabulosa
fortuna do Brasil. E, não raro, a mestra citava igrejas construídas em Portugal
com o ouro levado daqui, e aludia à escravidão dos índios e dos negros.
Quando um estudante sai do
primário, penetra no ginasial, e, apesar de passar por um mundo de matérias que
não interessam, chega à Faculdade. Então, os professores começam a ensinar,
precisamente, o contrário:
– O Brasil é um país
subdesenvolvido.
Os noticiários confirmam isso,
com o tempo. Os governos se sucedem, alguns emitindo a torto e a direito,
muitos a realizar empréstimos no estrangeiro. Ministros viajam, todos os dias,
à cata de investidores. Chegam esmolas da Aliança Para o Progresso. Imposições
do Fundo Monetário Internacional. Adquirimos concessionárias estrangeiras, e,
depois, as entregamos aos antigos donos, para que estes continuem a
explorá-las, a nos explorar. Contratos garantem que empresas norte-americanas
não sofrerão, jamais, prejuízos aqui, pois nosso ouro cobrirá quaisquer danos,
pelo acordo firmado pelo Embaixador Juraci Magalhães, embora as empresas
brasileiras possam pedir concordatas e ir à falência. Surgem os pregoeiros que
divulgam a péssima qualidade da indústria nacional, para que a financiada por
outros países comande nossa produção e nosso mercado interno. O Sr. Otávio
Gouvêa de Bulhões, que considerou crime de lesa-pátria a Lei de Remessa de
Lucros, foi contemplado com o cargo de Ministro da Fazenda. E quem protestar
não receberá o justo valor de patriota; será chamado de comunista, de
subversivo...
Gostaria, agora, de reencontrar a
professora do Grupo Escolar Amauri de Medeiros. Seria divertido ver sua cara,
quando lhe perguntasse:
– Professora, que quer dizer
mesmo o amarelo da bandeira?...
(Telhado de Vidro, volume I; Editora Bradil, Rio de Janeiro, 1967)
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