domingo, 10 de outubro de 2021

FILME INFANTIL

O assunto foge ao pequeno alcance de meus conhecimentos. Tenho cá comigo, todavia, uma dúvida: será conveniente teatro infantil representado por crianças?

Deixo a questão aos pedagogos.

Assisti, em alguns países mais desenvolvidos, no assunto educação, que o nosso, a alguns espetáculos para crianças. Os atores eram adultos.

Um professor me disse:

- O teatro de crianças cria nas espectadoras certa inveja, a qual pode transformar-se numa espécie de sentimento de inferioridade. Ao mesmo tempo em que a menina assistente gosta da beleza e da bondade da que interpretou, digamos, a Branca de Neve, pode julgar que não é tão boa nem tão bela quanto a outra...

Ainda perguntei:

- Não haveria a possibilidade da espectadora aceitar o exemplo, e, recebendo a lição da peça, procurar ser tão boa e tão bela quanto a outra?

- Dificilmente, esclareceu o professor. A prática tem demonstrado o contrário.

Não sei até que ponto isso é real. O assunto, já disse, foge ao pequeno alcance de meus conhecimentos. Por isso, a dúvida permanece. Temos educadores, pedagogos ilustres, que poderão dar a última palavra sobre essa questão...

De qualquer maneira, assisti, com entusiasmo, ao filme “O Parque”, realizado, por iniciativa própria, pela culta (embora jovem) professora Maria José Alvarez. E não posso negar: assisti a espetáculo extraordinário, admirável, encantador.

A Profª deu-me a honra de uma exibição especial de seu filmezinho de quinze minutos de duração. Carlos Alberto, o “China”, de 11 anos de idade, faz o papel principal do menino pobre que se põe a trabalhar, para conseguir dinheiro a fim de gozar as delícias de um parque de diversões. Engraxa sapatos, vende garrafas vazias, ajunta ferro velho, negocia até seu canário cantador, e, quando reúne o suficiente para pagar ao carrossel, à roda gigante etc., o parque de diversões já encerrou a temporada e foi desarmado...

É comovente. O roteiro foi escrito pela menina Graça Rangel, de 15 anos, aluna do segundo ginasial. Carlos Egberto, tem 17 anos. Claro que a orientação coube a adultos, porque há cortes excelentes; mesmo assim, foi um filme de crianças para crianças. Estas atuaram, inclusive, no laboratório. E, num caso como este, não creio que se aplique, de forma alguma, o ponto-de-vista do mestre que me falou sobre a Branca de Neve.

“O Parque” é educativo. Exibe aspecto construtivo de grande alcance, de beleza rara. O espectador mirim se compadece do menino pobre. Vive, na luta do “China”, o drama comum, bem brasileiro, de milhares de meninos pobres. Sente a indignidade social da divisão de castas. Aprende ida. Aprende amor. Honradez. Importância do trabalho como fator de vitória. E foi pena a vitória do “China”, pelo trabalho, não se tivesse concretizado...

Sem nenhum apoio, empregando verbas de sua própria economia, com sacrifício, idealismo, dedicação, a Profª Maria José Alvarez realizou algo admirável. É mestra na acepção do vocábulo.

E não duvido de que venha a sofrer perseguições movidas pela inveja das que não sabem fazer o mesmo...

(In Telhado de Vidro. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 22 de agosto de 1964)

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